Por Fernando Elisio Amaral Torres e Natalia Santana L. B. Figueiredo
A técnica de ablação total de conduto auditivo é realizada como tratamento cirúrgico, ela é indicada em casos que não respondem ao tratamento clínico e ocorrem recidivas de otites levando ao quadro de hiperplasia epitelial e em casos de neoplasias, principalmente na porção horizontal do conduto auditivo. Em algumas circunstâncias pode ser associada à técnica de osteotomia da bula timpânica, quando existe um comprometimento da bula timpânica por otite média ou neoplasias. Otite externa é uma inflamação do epitélio do conduto auditivo, pode ter o aparecimento de infecção secundária por fungos e bactérias e com isso evoluir para hiperplasia epitelial e estenose do conduto auditivo, podendo fechar totalmente o conduto, podendo ter ou não acometimento da bula timpânica. Otite externa é de grande prevalência na rotina clínica de pequenos animais, tem maior incidência no verão.
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MATERIAIS E MÉTODOS
Esse trabalho segue um modelo de análise descritivo que utiliza de um estudo de caso com abordagem qualitativa. O atendimento do paciente foi realizado em uma clínica veterinária na zona sul do Rio de Janeiro.
Os materiais incluem o exame clínico, com sintomatologia, histórico médico e prontuário do paciente, além de imagens e informações sobre o procedimento cirúrgico e acompanhamento pós cirúrgico. Para avaliação da relevância do estudo, foi feito um comparativo dos sinais clínicos apresentados antes e depois do procedimento cirúrgico. Literaturas consultadas para auxiliar em comparativo e resultado do tratamento foram Fossum (2021), Slatter (2007), Foster.A, Morandi.F, May .E (2014) e Huang.h.et al (2009).
RELATO DE CASO
Paciente canina da raça Pastor de Shetland, fêmea de 11 anos, pesando 11,8Kg, que chegou encaminhado para cirurgia, devido à estenose de conduto auditivo (figura 1) por otite crônica bilateral. Foi realizado o procedimento cirúrgico em ambos os lados, porém em momentos distintos.
Fonte: Arquivo pessoal (2021)
A médica-veterinária que estava acompanhando relatou que o paciente tinha um longo histórico de otites recorrentes e após o exame clínico foi constatado que o conduto auditivo estava estenosado e com presença de exsudato e tinha um odor fétido (hemograma, úreia, creatinina, ALT, albumina e glicose). A mesma suspeitava de neoplasia. Foram então solicitados exames pré-operatórios (checkup 1, ecocardiograma, radiografia de crânio e tórax e tomografia de crânio), onde não foram evidenciadas alterações que suspendessem o procedimento cirúrgico. Na tomografia foi evidenciado conteúdo homogêneo no canal horizontal e cavidade timpânica, espessamento e hipercaptação do canal vertical e pavilhão auricular, associado com estenose total do conduto auditivo externo. A cirurgia foi realizada segundo Fossum (2021) pela técnica de Ablação total de conduto auditivo (ATCA) associada à Osteotomia da bula timpânica (OBT).
Realizando medicação pré-anestésica, tricotomia, assepsia do local com clorexidina degermante seguida de clorexidina alcoólico. Na sequência, foram feitos os bloqueios dos nervos auriculotemporal e auricular caudal, que abrangem o conduto auditivo externo, bula timpânica e pavilhão auricular (figura 2).
Fonte: Arquivo pessoal (2021)
Realizada uma incisão em T, onde a incisão horizontal foi até o final do conduto auditivo, seguida de uma dissecção ao redor do mesmo, rente a cartilagem (Figura 3) até deixá-lo desprendido da orelha, sendo realizado uma incisão ao redor do pavilhão (Figura 4) que se encontrava fechado devido a estenose.
A dissecção do conduto auditivo foi até a sua porção horizontal, chegando na parte óssea da abertura da bula timpânica. Nesse ponto com uso de bisturi promoveu-se a incisão da cartilagem do conduto auditivo (Figura 5), expondo a entrada da bula timpânica.
Cuidadosamente foi realizada a curetagem da bula, após a retirada de todo material contaminado da cavidade timpânica e lavagem com soro fisiológico (Figura 6).
Fonte: Arquivo pessoal (2021)
O tecido subcutâneo foi fechado com poliglecaprone 2-0 e poligalactina 3-0 e a sutura de pele foi realizada com nylon 4-0 em formato de T. Foi realizado colocação de dreno e sonda, que permaneceu por dois dias, para remoção de secreção e para a aplicação de bupivacaina (Figura 7). No pós-operatório foram utilizadas as seguintes medicações: cloridrato de tramadol 4 m/kg/BID/SC ; ceftriaxona 30 mg/ kg/BID/IV ; Dexametasona 1 mg/kg/BID/SC ; Dipirona 25 mg/kg/BID/SC. Após dois dias o paciente foi liberado para casa com as seguintes medicações: predinisolona 1 mg/kg/SID/PO durante 5 dias (Prediderm 20® – Ourofino) ; Cloridrato de tramadol 4 mg/kg/BID/PO durante 5 dias (Nulli® – Ourofino) ; Cefalexina 30 mg/kg/BID/PO durante 10 dias (Celesporin 600® – Ourofino) ; Tartarato de ketanserina e asiaticosideo/Bid na ferida cirúrgica (Regepil®- Ourofino).
No pós-operatório foi realizado curativo oclusivo trocado uma vez ao dia. O dreno foi removido com cinco dias de pós-operatório (Figura 8). E os pontos com 15 dias após a cirurgia, apresentando uma boa recuperação (Figura 9). O conduto auditivo foi encaminhado para exame histopatológico e teve como resultado, otite hiperplásica em padrão polipóide-adenomatoso.
Fonte: Arquivo pessoal (2021).
Fonte: Arquivo pessoal (2021).
DISCUSSÃO
No seguinte relato o paciente apresenta estenose bilateral de conduto auditivo como resultado de uma otite crônica não responsiva a tratamento clínico, nesse caso o tratamento cirúrgico escolhido foi ablação total de canal auditivo4, essa técnica é recomendada em casos de otite externa em estágio final e quando o tratamento clinico não se faz eficaz. Utilizando essa técnica com o objetivo de remover o conduto auditivo vertical e horizontal, solucionando o problema e dando conforto ao paciente.
Os exames pré-operatório foram realizados, incluindo a radiografia e a tomografia de crânio3, que permitiu uma melhor visualização das alterações existentes e extensão do quadro1,3. Mostrando que a tomografia é a melhor escolha, pois evita sobreposição, como na radiografia além de proporcionar maior clareza quanto às alterações do ouvido.
Não foi visualizado na cirurgia e não foram evidenciadas no pós-operatório alterações sugestivas de lesão no nervo facial1,4, sendo uma das complicações mais encontradas a paralisia do mesmo, que geralmente é temporária e tem redução dos sinais em duas semanas.
No caso em questão, foi colocado um dreno por conta de secreção e sangramento e para a aplicação de cloridrato de bupivacaina para controle da dor4, assim que é de extrema importância do dreno, devido a números de problemas pós-operatórios que podem causar, levando a abscessos ou contaminação em casos de difícil higienização. A ferida cirúrgica em toda a recuperação ficou com bom aspecto não tendo nenhuma intercorrência, como deiscência de sutura.
A histopatologia é importante para fechar diagnóstico e entender o que levou a esse quadro2.
O resultado revelou hiperplasia epitelial devido a otite crônica, que tem presença de glândulas sebáceas e ceruminosas, se tornando hiperplásicas em quadros de otite crônica2.
CONCLUSÃO
O seguinte relato mostrou que em casos de otite crônica temos o surgimento de hiperplasia no conduto, levando a problemas recorrentes e arresponsivo ao tratamento clínico padrão, sendo indicado então o tratamento cirúrgico para resolução do problema. O trabalho mostra a eficiência da técnica de ablação do conduto auditivo associada a osteotomia da bula timpânica. Foi evidenciado também a importância do exame de tomografia, que nos deu uma melhor noção do quadro, mostrando exatamente as alterações no conduto auditivo e bula timpânica, tendo uma melhor visualização do que quando comparado a radiografia, que não evidencia muito bem a lesão e dificulta um pouco a interpretação da imagem pelo fato de haver sobreposição. O resultado da histopatologia foi condizente com os achados descritos em literatura, sendo a otite externa crônica um dos fatores responsáveis por hiperplasia epitelial. A recuperação da paciente foi excelente e o problema solucionado, como relatado pelos autores.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. FOSTER. A, MORANDI.F, MAY.E. Prevalence of ear disease in dogs undergoing multidetector thin-slice computed tomography of the head. Vet Radiol Ultrasound. 2015 Jan-Feb; 56(1): 18-24. doi: 10.1111/vru.12180. Epub 2014 Jul 21. PMID: 25046431.
2. HUANG. H. et al. “Histological changes in the external ear canal of dogs with otitis externa.” Veterinary dermatology vol. 20,5-6 (2009): 422-8. doi:10.1111/j.1365-3164.2009.00853.x.
3. MACPHAIL.C,FOSSUM.T.W.Cirurgia de ouvido. In: Fossumet.al. Cirurgia de pequenos animais. 5ª edição.Glendale: Gen, 2021, cap.17,p.302-329.
4. KRAHWINKEL.D.J. Orelha. In: Slatter et.al. Manual de cirurgia de pequenos animais. 3ª edição: cidade, Manole, 2007, cap 14, p.1757-1766.
Dr. Fernando Elisio Amaral Torres
Formado pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro; Mestrado pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro na área de Clínica Médica; Equiparação do título de mestre pela Universidade de Lisboa- Portugal; Pós-graduação em Cirurgia de Tecidos Moles pela Anclivepa-SP; Pós-graduação na área de Odontologia Veterinária pela FAMESP; Professor do curso de Pós-graduação em Cirurgia de tecido Moles no CDMV/RJ; Professor do curso de Pós-graduação em Dermatologia do CDMV/RJ; Professor do Curso de técnica cirúrgica do CDMV/RJ; Professor do Curso de cirurgia de tecidos moles e Felinos da Anclivepa/RJ; Professor das disciplinas de Cirurgia de Pequenos animais e de Estágio supervisionado da Universidade Estácio de Sá- Campus Vargem Pequena/RJ; Responsável Técnico pela Policlínica Veterinária da Universidade Estácio de Sá-Campus Vargem Pequena/RJ; Clínico Cirurgião das Clínicas veterinárias Jardim Guanabara, IEMEV e Dok.
Natalia Santana L. B. Figueiredo
Graduada em Medicina Veterinária pela Universidade Estácio de Sá; Pós-graduação em Cirurgia de tecidos moles pela Qualittas; Atua na área de clínica médica, odontologia e cirurgia de tecidos moles.
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